Beira Meu Amor

A Beira foi o grande amor da minha vida. Recebeu-me com seis anos, em Novembro de 1950 e deixei-a, com a alma em desespero e o coração a sangrar, em 5 de Agosto de 1974. Pelo meio ficaram 24 anos de felicidade. Tive a sorte de estar no lugar certo, na época certa. Fui muito feliz em Moçambique e não me lembro de um dia menos bom. Aos meus pais, irmão, outros familiares, amigos e, principalmente, ao Povo moçambicano, aqui deixo o meu muito obrigado. Manuel Palhares

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quarta-feira, maio 10, 2006

Do Largo do Município até à Praça da Índia - IV


4ª Parte

Continuávamos à porta do S. Jorge: uns, sentados no pequeno muro por baixo do mural do Santo, iam recordando os tempos por ali passados; outros foram dar uma espreitadela à sala do cinema. Mas que noite maravilhosa aquela que estávamos a passar! Quantas emoções se sentiram por aqueles lados, quantas recordações se reviveram. Estávamos nós por ali, quando, de repente, vimos uma luz muito brilhante, para os lados do café do cinema, acompanhada por uma música, as quais pareciam chamar por nós. Atónitos, levantámo-nos e, como se fôssemos bonecos telecomandados, contornámos o cinema e dirigimo-nos para a parte da avenida que dali do café nos levava até à Praça da Índia. Parámos, de costas para o café, e olhámos para o terreno que ficava à nossa frente: era dali que vinham aquela forte mas suave luz e aquela música tão apelativa. De repente surgiu uma intensa neblina que nos rodeou e isolou do cenário que nos envolvia: só nós, aquela luz e aquela música.
- Que cacimba será esta? Que cacimba será esta? - ainda se ouviu alguém perguntar.
- Minhas senhoras e meus senhores! Sejam muito bem-vindos, de novo, a este lugar onde estão guardados os sonhos da vossa infância e juventude. Quem sou eu, perguntais vós?! Pois eu sou o apresentador, o mestre de cerimónia de todos os circos que por aqui montaram tenda - o Boswell Wilkie Circus, o Brian Boswell Circus e o Circo do Brasil. Entrem, entrem. Não façam cerimónias. Venham aqui ver, de novo, as crianças que uma vez todos vós já foram. Estão todos cá, guardados no arquivo da minha memória. Afinal um flashback de vez enquando não faz mal a ninguém e ajuda a refrescar a memória, para depois contarem histórias aos netos - dizia-nos do centro de uma enorme pista de circo , um gigante apresentador, vestido a preceito. E por uns mágicos momentos vimos passar diante dos olhos todas aquelas coisas de encantar: os malabaristas, os contorcionistas e os trapezistas; mais os animais, os engraçados anões e os palhaços. Nós, que começámos por nos sentar nas bancadas com a idade e o aspecto que temos hoje, de repente, com um toque da varinha do prestidigitador, transformámo-nos por uns momentos - apenas por uns momentos - nas crianças que éramos então. Foi aí que vi a Odília a correr atrás do Paulo, o qual se preparava para subir lá para cima, para os trapézios...
Meus caros amigos, pois era ali, junto ao S.Jorge, do outro lado da rua - a que agora nos há-de levar até à Praça da Índia - que os circos que visitavam a Beira montavam a tenda e nós, crianças e adolescentes, fomos actores de todas as aventuras e de todos os sonhos que o circo desperta em nós.
Com amizade,


Manuel Palhares

Odivelas, 10 de Maio de 2006.

9 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Manel
Como é bom recordar...
Eu morei no Bairro do Perroviário e quando o circo Boswel chegava, sempre de comboio,e descarregavam começava o nosso primeiro espectáculo. Não arredavamos pé a ver aquele mundo.
Um abraço
M.Costa

quinta-feira, maio 11, 2006 2:09:00 da tarde  
Blogger Manuel Palhares said...

Costinha,

Era a fascinação,imagino,ver toda aquela confusão a sair do comboio.Devia ser um espectáculo como dizes. E recordar não aleija ninguém, afinal.
Um abraço,

Manel

quinta-feira, maio 11, 2006 8:02:00 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Meu querido Manel!
Como foi bom falar hoje contigo e saber que continuo sendo a tua Andorinha!
Como é bom passear pelo teu blog, apreciar teu esforço, e ouvir boa musica como se fazia nos nossos tempos!
Era para te deixar aqui um poema meu, mas amanhã ponho, hoje só te deixo meu beijinho assim como para a Angela, e meu "borrachinho"a quem desejo tudo de bom. Joquinhas e bom fim de semana
São (andorinha)

sábado, maio 13, 2006 7:02:00 da tarde  
Blogger Manuel Palhares said...

São, minha linda andorinha,

Também eu gostei muito de falar contigo.
Muito obrigado pelas tuas bondosas palavras acerca do blog. Devias cá ter deixado o teu poema.
Uma boa semana para ti.
Um beijinho,

Manel


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Coca-Cola,

Obrigado pela tua visita e por esta fantástica resposta. Gostei muito. Parabéns! Depois não queres que eu diga que, o que escreves, é mais que uma brincadeira.
Um beijinho,

Manel

segunda-feira, maio 15, 2006 5:00:00 da tarde  
Blogger Manuel Palhares said...

Isabel,

Obrigado pela visita.
Já lá vão muitos anos e é natural que não nos lembremos de tudo.
Desta vez ficaste-te apenas pela recordação da música.
Uma boa semana para ti.
Um beijinho,

Manel

terça-feira, maio 16, 2006 3:46:00 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

querido Manuel Palhares,

Então, e não é que durante estes escassos minutos de leitura perpassaram pela minha mente as alegres idas ao circo! Não só na meninice e juventuda. Até na idade adulta.

Também o meu marido era amante do circo e não faltavamos nunca, mesmo antes da nossa filha ter nascido!

Muito obrigada por estes breves mas bonitos momentos que nos proporcionas.

Um beijinho com muito carinho, da Aida

segunda-feira, junho 05, 2006 3:55:00 da tarde  
Blogger Manuel Palhares said...

Querida Aida,

Valeu a pena ter escrito a crónica pelas recordações que despertou nos amigos.
Eu é que agradeço, minha amiga.
Um beijinho com muito carinho,

Manel

terça-feira, junho 06, 2006 6:54:00 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Bem me lembro do circo que armava a tenda em frente ao S.Jorge. Devem lembrar-se do burro sábio do Prof. Dalot... o burro não foi autorizado a viajar de regresso a Portugal. Na última noite da actuação do burro, o Dalot chorou, abraçou e o animal. Consternou todos os espectadores e a mim também...Acabei por comprar o burro por mil escudos. Levei-o para frente de minha casa nas Palmeiras. O raio do burro quando lhe dizia as palavras do prof. Dalot não fazia nada, apenas, dava coices! Esteve por ali a pastar uns dias. Soltou-se uma noite e um noctivago que vinha do Estoril deu-lhe uma trombada,esmurrou o carro e matou-me o burro. Cortei-lhe a cabeça, mandei-a embalsemar e esteve pendurado por uns tempos na casa de leilões que tive (Martins dos Leilões). A boca do burro começou abrir-se e parecia que estava a rir de escárnio das pessoas. Acabei por a oferecer ao Belguerra do Moulin Rouge e ficou por lá até não sei quando....abandonei a Beira, ao fim de 10 anos e fui apregoar para outro país, Rhodésia (entenda-se não em leilões) mas trabalhar noutra profissão que foi a de mecânico.
Abraços de Bangkok.
José Martins

quinta-feira, junho 08, 2006 10:20:00 da manhã  
Blogger Manuel Palhares said...

Caro José Martins,

Muito obrigado por partilhar connosco esta interessante história do burro do circo.
Como bom português que é, o José corre o mundo. Oxalá que tudo lhe corra sempre bem aí pela Tailândia.
Um abraço,

Manuel Palhares

sábado, junho 10, 2006 3:43:00 da tarde  

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