Beira Meu Amor

A Beira foi o grande amor da minha vida. Recebeu-me com seis anos, em Novembro de 1950 e deixei-a, com a alma em desespero e o coração a sangrar, em 5 de Agosto de 1974. Pelo meio ficaram 24 anos de felicidade. Tive a sorte de estar no lugar certo, na época certa. Fui muito feliz em Moçambique e não me lembro de um dia menos bom. Aos meus pais, irmão, outros familiares, amigos e, principalmente, ao Povo moçambicano, aqui deixo o meu muito obrigado. Manuel Palhares

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quinta-feira, setembro 18, 2008

O Menino Manuelzinho I



Meus caros amigos,

Hoje venho-vos falar de uma pessoa especial: o menino Manuelzinho!
Como éramos amigos...

Que me desculpem os meus maiores amigos de agora - e graças aos deuses que tenho vários! -, mas o menino Manuelzinho foi, sem dúvida, o meu melhor amigo, até aos meus doze, treze anos.
Andávamos sempre juntos e só nos separávamos à noite quando íamos para a cama. E, mesmo assim, por vezes, ainda sonhava com ele, e penso que ele também sonhava comigo.
Ele era muito mais esperto e corajoso do que eu e, por isso, era sempre ele quem tinha as ideias para as nossas brincadeiras. Eu é que às vezes lhe dizia que não brincava a certas coisas, com receio que os meus pais ficassem aborrecidos comigo. Aí, nessas ocasiões, ele ficava furioso e chamava-me medricas, menina e outros nomes, mas, passado um bocado, já não estava zangado e surgia-lhe outra ideia para outra brincadeira.
E como ele tinha ideias e que ideias!

Um dia, propunha-me que brincássemos ao Tarzan, como tínhamos visto nos filmes, nos cinemas Rex ou Olímpia, lá longe, em Moçambique, na cidade da Beira e, assim, trepávamos a todas as árvores do Jardim do Bacalhau, saltando de ramo em ramo.

Outro dia, dizia-me para atirarmos para o chão todos os gatos que se tinham refugiado dos cães nessas árvores, para os vermos a bufar e a lutar com eles. Coitada da minha gata Zoé, que se não fossem os hóspedes da Pensão Leão de Ouro acorrerem aos gritos aflitos da minha mãe e afugentarem os cães, tinha morrido... mas, mercurocromo aqui, sulfamidas ali, sopinhas de leite dadas pela minha mãe e uns dias de convalescença e lá de safou. Ela que até me vinha lamber o queixo, quando eu fingia que choramingava com alguma palmada da minha mãe!

Noutro dia ainda, o meu amigo lembrou-se de fazer negócios, e eu troquei a lanterna de caça do meu pai e o respectivo cinto com a caixa das pilhas, por uma carruagem de comboio de lata e dois ou três berlindes coloridos.
O menino Manuelzinho andou comigo de trotineta e de patins no ringue do Jardim do Bacalhau e fizemos as coisas mais perigosas que possam imaginar nos baloiços que, chegar ao fim do dia vivos, era já um milagre...

(continua!)

Manuel Palhares

Odivelas, 18 de Setembro de 2008.

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